Viver a fé! [30]
A reflexão sobre «a comunidade política» ocupa o oitavo capítulo do Compêndio da Doutrina Social da Igreja. No primeiro ponto, como nos capítulos anteriores, faz-se referência aos «aspetos bíblicos» (números 377 a 383) relacionados com esta temática: o senhorio de Deus (377-378); Jesus e a autoridade política (379); as primeiras comunidades cristãs (380-383).
O senhorio de Deus
«O povo de Israel, na fase inicial da sua história, não tem reis, como os demais povos, porque reconhece tão-somente o senhorio de Iahweh. É Deus Quem intervém na história através de homens carismáticos, conforme testemunha o Livro dos Juízes. Ao último destes homens, Samuel, o povo pedirá um rei semelhante» (377). Face à insistência do povo, Deus envia Samuel para derramar a unção real sobre Saúl. «O protótipo de rei escolhido por Iahweh é David [...]. É o depositário da promessa, que o coloca na origem de uma tradição real, precisamente a tradição ‘messiânica’, a qual, não obstante todos os pecados e infidelidades do mesmo David e dos seus sucessores, culmina em Jesus Cristo, o ‘ungido de Iahweh’ [...]. O fracasso, no plano histórico, da realeza não ocasionará o desaparecimento do ideal de um rei que, em fidelidade a Iahweh, governe com sabedoria e exerça a justiça» (378).Jesus e a autoridade política
«Jesus rejeita o poder opressivo e despótico dos grandes sobre as nações (cf. Marcos 10, 42) e as suas pretensões a que lhes chamem protetores (cf. Lucas 21, 25), mas nunca contesta diretamente as autoridades do seu tempo. [...] Jesus, o Messias prometido, combateu e desbaratou a tentação de um messianismo político caracterizado pelo domínio sobre as nações. Ele é o Filho do Homem que veio ‘para servir e entregar a própria vida’» (379).As primeiras comunidades cristãs
«A submissão, não passiva, mas por razões de consciência ao poder constituído corresponde à ordem estabelecida por Deus. São Paulo define as relações e os deveres dos cristãos para com as autoridades (cf. Romanos 13, 1-7). [...] O Apóstolo certamente não pretende legitimar todo o poder, antes procurando ajudar os cristãos a ‘fazer bem diante dos olhos de todos os homens’ (Romanos 12, 17), também nas relações com a autoridade, na medida em que esta está ao serviço de Deus para o bem da pessoa [...]. São Pedro exorta os cristãos a submeterem-se ‘a toda a instituição humana, por amor do Senhor’ (1Pedro 2, 13). O rei e os seus governadores têm a função de ‘punir os malfeitores’ e ‘louvar os bons’ (cf. 1Pedro 2, 14). A sua autoridade deve ser ‘honrada’, isto é, reconhecida, porque Deus exige um comportamento reto [...]. Trata-se portanto de uma obediência livre e responsável a uma autoridade que faz respeitar a justiça, assegurando o bem comum» (380). Assim, «a oração pelos governantes, recomendada por São Paulo durante as perseguições, indica explicitamente o que a autoridade política deve garantir: uma vida calma e tranquila a transcorrer com toda a piedade e dignidade (cf. 1Timóteo 2, 1-2)» (381). «Quando o poder humano sai dos limites da vontade de Deus, se autodiviniza e exige submissão absoluta, torna-se a Besta do Apocalipse, imagem do poder imperial perseguidor [...]. Esta visão indica profeticamente todas as insídias usadas por Satanás para governar os seres humanos, insinuando-se no seu espírito com a mentira. Mas Cristo é o Cordeiro Vencedor de todo o poder que se absolutiza no curso da história humana» (382). «A Igreja proclama que Cristo, vencedor da morte, reina sobre o universo que Ele mesmo resgatou. O seu reino estende-se a todo o tempo presente e terá fim somente quando tudo for entregue ao Pai e a história humana se consumar com o juízo final (cf. 1Coríntios 15, 20-28). Cristo revela à autoridade humana, sempre tentada ao domínio, o seu significado autêntico e completo de serviço. Deus é o único Pai e Cristo o único mestre para todos os homens, que são irmãos. A soberania pertence a Deus. [...] A mensagem bíblica inspira incessantemente o pensamento cristão sobre o poder político, recordando que este tem a sua origem em Deus e, como tal, é parte integrante da ordem por Ele criada. Tal ordem é percebida pelas consciências e realiza-se na vida social mediante a verdade, a justiça e a solidariedade, que conduzem à paz» (383).«Não esqueçamos, em nenhum momento, que a participação política é sempre busca da verdade, expressão do amor fraterno, escolha da honestidade e da generosidade como padrões de comportamento» (Conferência Episcopal Portuguesa, «Comunicado do Conselho Permanente sobre a situação política presente», 14.12.2004).
© Laboratório da fé, 2015
Os números entre parêntesis dizem respeito ao «Compêndio da Doutrina Social da Igreja»
na versão portuguesa editada em 2005 pela editora «Princípia»
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