Viver a fé! [26]
Os «aspetos bíblicos» ocupam o primeiro ponto do sétimo capítulo do Compêndio da Doutrina Social da Igreja dedicado ao tema intitulado «vida económica». Este primeiro ponto (números 323 a 329) subdivide-se em duas alíneas: «o homem, a pobreza e a riqueza»; «as riquezas existem para serem partilhadas».
O homem, a pobreza e a riqueza
«No Antigo Testamento percebe-se uma dupla postura em relação aos bens económicos e à riqueza. Por um lado, apreço em relação à disponibilidade dos bens materiais considerados necessários para a vida [...]. Por outro lado, os bens económicos e a riqueza não são condenados por si mesmos, mas pelo seu mau uso» (323), Entretanto, nomeadamente nos textos proféticos, a pobreza (oprimidos, fracos, indigentes), mesmo sendo um mal, é apresentada como um símbolo da situação humana diante de Deus. Por conseguinte, «aquele que reconhece a própria pobreza diante de Deus, qualquer que seja a situação que esteja a viver, é objeto de particular atenção da parte de Deus: quando o pobre O procura, o Senhor responde; quando grita, Ele escuta-o. Aos pobres se dirigem as promessas divinas: eles serão os herdeiros da aliança entre Deus e o seu povo. [...] A pobreza, quando é aceite ou procurada com espírito religioso, predispõe ao reconhecimento e à aceitação da ordem criacional; o ‘rico’, nesta perspetiva, é aquele que repõe a sua confiança mais nas coisas que possui do que em Deus, o homem que se faz forte pela obra das suas mãos e que confia somente nessa força. A pobreza assume valor moral quando se manifesta como humilde disponibilidade e abertura em relação a Deus, confiança n’Ele. Estas atitudes tornam o ser humano capaz de reconhecer a relatividade dos bens económicos, tratando-os como dons divinos para administrar e partilhar, porque a propriedade originária de todos os bens pertence a Deus» (324). «Jesus assume toda a tradição do Antigo Testamento também sobre os bens económicos, sobre a riqueza e sobre a pobreza, conferindo-lhe definitivas clareza e plenitude [...]. O Reino inaugurado por Cristo aperfeiçoa a bondade originária da criação e da atividade humana, comprometida pelo pecado. Libertado do mal e reintroduzido na comunhão com Deus, cada ser humano pode continuar a obra de Jesus, com a ajuda do seu Espírito: fazer justiça aos pobres, resgatar os oprimidos, consolar os aflitos, buscar ativamente uma nova ordem social, em que se ofereçam adequadas soluções à pobreza material e venham impedidas mais eficazmente as forças que dificultam as tentativas dos mais fracos de se libertarem de uma condição de miséria e escravidão. Quando isto acontece, o Reino de Deus faz-se já presente sobre esta Terra, embora não lhe pertença. Nisto encontrarão cumprimento, finalmente, as promessas dos profetas» (325). Em resumo, «a atividade económica deve ser considerada e desenvolvida como resposta reconhecida à vocação que Deus reserva a cada ser humano. [...] A atividade económica e o progresso material devem ser colocados ao serviço» (326) dos outros. «A fé em Jesus Cristo consente uma correta compreensão do progresso social, no contexto de um humanismo integral e solidário» (327).As riqueza existem para serem partilhadas
«Os bens, ainda que legitimamente possuídos, mantêm sempre um destino universal: é imoral toda a forma de acumulação indébita, porque se encontra em aberto contraste com o destino universal consignado por Deus Criador a todos os bens. A salvação cristã é, efetivamente, uma libertação integral do ser humano, libertação da necessidade, mas também em relação às próprias posses: ‘a raiz de todos os males é o amor ao dinheiro’» (328). «As riquezas realizam a sua função de serviço ao homem quando destinadas a produzir benefícios para os outros e a sociedade. [...] Elas são um bem que vem de Deus: quem o possuir, deve usá-lo e fazê-lo circular, de sorte que também os necessitados possam fruir; o mal está no apego desmedido às riquezas, no desejo de açambarcá-las. São Basílio Magno convida os ricos a abrirem as portas dos seus armazéns [...]. A riqueza, explica São Basílio, é como a água que flui mais pura da fonte na medida em que dela se haure com mais frequência, mas que apodrece se a fonte permanece inutilizada. O rico, dirá mais tarde São Gregório Magno, não é mais que um administrador daquilo que possui; dar o necessário a quem necessita é obra a ser cumprida com humildade, porque os bens não pertencem a quem os distribui. Quem tem as riquezas somente para si não é inocente; dar a quem tem necessidade significa pagar uma dívida» (329).© Laboratório da fé, 2015
Os números entre parêntesis dizem respeito ao «Compêndio da Doutrina Social da Igreja»
na versão portuguesa editada em 2005 pela editora «Princípia»
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